Djeliah é uma cantora e compositora cosmopolita inspirada pela música de raiz africana: soul, jazz, reggae, que ela combina com sutis batidas e efeitos eletrônicos. Seu primeiro album chamado Beauty conta a jornada de despertar espiritual dela. Ela está atualmente lançando o segundo album chamado The Sun is Rising.
Eu li uma matéria da jornalista Lucy Duran falando que na África do Oeste não existia a palavra música mas se usa a palavra “djeliah”, que significa o que acontece quando a música esta sendo tocada. É a conexão entre as pessoas e também com o Divino.
Esse album é a continuação do primeiro (Beauty, 2014) . Eu compus essas músicas quando morava em Londres entre 2005 e 2009. Amava música e gostava muito de cantar mas não sabia tocar quase nada e uma amiga me mostrou como usar o Garage Band. Comecei a brincar com camadas de vozes e beats que modificava. Sempre escrevi textos desde que eu sou criança então texto já era algo mais natural para mim. Minhas músicas são mensagens.
Procurei a vida toda uma maneira de promover a paz no mundo: estudei relações internacionais e vi que a politica não era o caminho para mim. Logo fui morar em Barcelona e comecei a estudar reiki, mudar meu estilo de vida e me banhei na efervescência cultural dessa capital. Foi ali que comecei com a música, fazia parte de uma banda de reggae chamada Orquestra Surprise.
A minha música é o relato dessa busca de sentido pessoal mas sempre com uma perspectiva global. Por isso as minhas letras são em inglês. Eu reverencio Bob Marley e Fela Kuti, queria passar mensagens como eles sobre politica, sociedade e consciência.
“ Sua música transmite um lindo e desvendado senso de auto afirmação perfeitamente combinado com uma reverência pelos outros, pelo mundo e pelo cosmos.”
Sou francesa mas nunca me identifiquei muito com a minha nacionalidade. Os meus pais não me encorajaram ao patriotismo, ao contrario, sempre me falaram para viajar, expandir a mente. Eles são bem autênticos e me transmitiram um olhar critico sobre o mundo. Eu não gosto quando querem me colocar no papel da “francesa sensual”. Não me interessa ter sucesso por causa do meu sotaque ou da minha bunda, considero que sou muito mais que isso.
O album é bastante variado ao nível musical, passando pelo eletrônico, jazz acustico, soul, reggae, funk e afrobeat. Foi gravado inteiramente no Vale do Capão, na Chapada Diamantina, na Bahia onde eu moro. Tem muitos músicos talentosos aqui e vários deles participaram do disco. Foi um processo leve e orgânico que demorou dois anos em total. O produtor principal, Gustavo Filograsso da banda Passagem Universo, foi a pessoa ideal para o projeto: muito professional, calma e compreensivo, amei trabalhar com ele.
Cada faixa conta uma historia diferente do mais intimo ao mais global, ligando essa duas polaridades do ser, expressando o que eu sinto vivendo nesse mundo dual: luz e sombra dentro e fora de mim…
A música de abertura se chama The Sun is Rising: é a sensação de se abrir para um novo mundo, um novo tempo, uns novos possíveis do lado da pessoa amada…tem pessoas que abrem mundos na gente, eles fazem a gente renascer…o nascer do sol, a luz invadindo o meu quarto esse dia me deu essa sensação, que estava começando uma nova vida, e foi… A arte entrou na minha vida como o sol no meu quarto, comecei a compor, me abri para o meu ser artista, essa pessoa me amando me deu permissão de ser eu mesma…
Nobody é um mistério! Não lembro nem ter escrito essa música, não sei quando aconteceu, veiou pronta com a letra e a melodia. É um jazz estilo Billie Holiday, eu amo a voz e o estilo musical dela. Amo Jazz. Cresci numa cidade onde tem um festival de Jazz cada ano. Meus pais me levavam de criança e ficava dormida ouvindo esse som…dormi ouvindo Miles Davis uma vez! Meu pai amava jazz, ele nasceu em 1948, depois da segunda guerra mundial. O jazz na França era associado a felicidade da liberação. Foram os soldados americanos que trouxeram e os músicos tocavam jazz nos bailes de celebração do fim da guerra… Meu avoo, o pai do meu pai, era musico naquela época e tocava jazz. Ele tocava bateria, saxofone alto e tenor, trumpeta e bandoneon. Infelizmente não conheci ele porque morreu quando meu pai tinha 11 anos mas sei que foi ele que passou esse amor pela música para nos e sou grata a ele por isso.
Nobody é a musica da “anti-heroina”: “Não quero ser famosa, não quero ser rica / Não quero ser vista / Não quero aparecer na pantalha / Ninguém, eu apenas quero ser ninguém/ Muito feliz de ser ninguém, ninguém, ninguém, nada mais que eu mesma! Mas o “nobody but” em inglês tem um doble sentindo: “nobody but me” significa também eu sou nada menos que eu mesma! Então na real, o máximo na vida, não é ser famoso ou rico, mas é ser você mesmo! Não tem ninguém igual a você, você foi criado único, e isso é o máximo valor, por isso qualquer expressão artística tem um valor incomensurável por si só, o que uma pessoa cria, num determinado tempo e espaço sempre é único
The One: é a música da carência total! É a criança que implora para ser amada! Eu sou essa criança carente até hoje, pedindo atenção, amor, carinho… cantar é isso também: me olhe, me ame, olha como eu sou especial cantando nesse palco! Faz de mim a sua preferida! É feio e ao mesmo tempo é muito humano, é pura vulnerabilidade, o choro da criança é puro…amor é a necessidade primaria, a criança pode sobreviver sem alimento mas não sem amor.. E todos temos essa sensação de que nos falta algo ou alguém e chega nesse ponto de desespero de implorar o amor para outra pessoa até começar a procurar por dentro…
Be the One: o antidoto da The One, Be the One, seja você mesmo o seu grande Amor!!! Você ja é completo em si, você tem tudo dentro! Seja quem você é, seja quem você sente e sabe que é, seja quem você nasceu para ser, liberta sua alma, liberte o seu corpo! Você é o filho preferido de Deus, você é Luz, você é Amor, não se faça pequeno! Isso é a mensagem quando começamos a conectar com a Fonte e com o no nosso Eu Superior… mas muita vezes esquecemos, e na verdade, isso é a brincadeira: esquecer e lembrar até a gente lembrar mesmo… essa música foi feita para você lembrar! É uma música para dançar, para celebrar você encontrar quem você é e ser isso mesmo! É a maior felicidade que tem, é a maior alegria. O ritmo é inspirado pelo Afro beat porque é um ritmo alegre e que também convida as pessoas a lembrar da verdadeira identidade. Afro beat trabalha com as entidades da natureza, que nem o candomblé, chamando essa força para o espirito da pessoa se erguer contra a dominação da mente
We Are the War: o titulo lembra a música do Mickael Jackson, We Are the World… amo a música dele também. Anos depois a guerra ainda acontece, a nova ordem mundial esta destruindo todo o planeta e a gente assistindo. Mas não existe nada que esteja separado da gente. Na verdade, somos ultimamente responsáveis por toda a criação. Ho’oponopono. Eu gosto muito dessa prática, a palavra significa “corrigir o erro”. Tem um erro de programa dentro da gente criando toda essa miséria e catástrofes. O erro maior é medo da escassez que gera a ganância sem limites e a destruição do meio ambiente. Acreditamos que não tem suficiente para todos, competimos, brigamos, We are the War, nos somos a guerra, nos somos o conflito… vivemos nessa ilusão e dualidade o tempo todo… Ho’oponopono, sinto muito, me perdoe, te amo, sou grata.
O homem foi tão longe nesse erro da ganância, do poder, da competição pelo poder, do medo que criou um sistema capaz de destruir todo o planeta e toda a humanidade: a bomba atômica. Na historia do universo, planetas já foram provavelmente destruídos por guerras nucleares, isso já existiu, já aconteceu, é possível… Deus cria todo que é, toda beleza e harmonia, faz cada milagre e o homem inventa de querer destruir todo. Temos livre arbítrio: a cada momento escolhemos criar ou destruir. A escolha é nossa e isso é a beleza, essa liberdade. Nada está escrito e o pior pode criar o melhor, a pior situação pode gerar o maior aprendizado e permitir a nossa evolução: dizem que sem a arma nuclear, a guerra fria não teria parado…mas até hoje renovamos esses sistemas de morte e destruição total do planeta, gastando bilhares em vez de gastar esse dinheiro para criar mais justiça social, saúde, educação… Humanidade.
Escrevi essa letra 20 anos atrás porem ela esta muito de atualidade. Meu espirito era muito novo mas já estava muito ligado a verdade, por isso gosto desse texto. É um “spoken word”, como um poema. As palavras musicadas ressoam melhor: “quero fazer uma revolução porque não aguento mais viver nessa grande mentira”. É assim que me sinto desde sempre: sinto que algo esta errado com esse sistema, com essa sociedade onde nasci e me criei. Sempre senti que algo estava querendo matar o meu espirito e o meu espirito estava resistindo silenciosamente. Hoje posso falar mais alto, subir no palco e falar essas palavras com a força que me anima e sei que outras pessoas vão ressoar com essa verdade. O meu nome espiritual é Sat Raj na tradição Sikh ligada a Kundalini Yoga, Sat é a verdade Raj é um rei. A verdade é o valor supremo para mim, eu nasci para ser a verdade, não posso viver na mentira, meu sistema não permite e essa busca pela verdade sempre me fez ir para frente até ter essa coragem que eu tenho hoje de me afirmar como artista e cantora.
Whatever é um grito para me proteger e me defender. Tem um aspecto dramático, como uma opera! Os violinos tocando staccato dão essa sensação de que algo trágico esta acontecendo: a tragédia são as vozes ressoando em mim de todas as pessoas que tentaram me dominar e me fazer sentir menos do que eu sou realmente, essas vozes são como fantasmas e tenho que cantar e gritar e tocar para afastar elas…Eu sei quem eu sou, eu sou quem eu sou e sou divina, eu me afirmo na minha real identidade, essas vozes não tem mais poder sobre mim…eu não vou mais entregar o meu poder e me deixar definir pelo outro ou pela sociedade…
Sempre senti uma conexão muito forte com a Africa, uma conexão de alma. Quando ouvi música africana por primeira vez, senti que algo profundo estava se movimentando em mim, algo muito vivo. E desde então senti um profundo respeito natural pela Africa e a cultura africana. Mais tarde tive a chance de visitar o continente varias vezes e sempre senti essa conexão com algo muito ancestral. A questão do racismo sempre foi um questionamento para mim: não conseguia nem entender porque um povo podia se considerar de alguma forma superior a outros povos.
Estudei relações internacionais na universidade e estudemos a questão das representações: como o povo estava sempre induzido a pensar que outro povo era inferior a ele para justificar a exploração que foi a colonização. Comecei a entender melhor. Essa música é o meu mea culpa positivo a Africa: quis declarar em voz alta o meu amor e respeito pelo Continente-Mãe de grandes civilizações e bem provavelmente mãe de todas elas. É para empoderar as pessoas afro-descendentes no mundo inteiro e dizer que eu respeito e que elas podem ter orgulho das suas origens. Falam que para combater o racismo os brancos tem que se posicionar; pois isso é a minha posição e espero que essa música sera recebida de acordo com a intenção com a qual escrevi ela.
Ela tem o mesmo título que a música do Chico César que é muito linda e foi um grande sucesso e marco no Brasil, foi sem querer, mas eu fico mais feliz ainda. Cantei uma parte em francês para ninguém reclamar que não cantei em francês no disco! E também falar que se a França, no imaginário popular, é o pais do amor, do romance, da arte, também criou muita dor no mundo e continua criando infelizmente e não podemos ignorar isso também. A cultura francesa ou Europea ou branca não é superior não. A cultura africana tem muito mais força e poder. Acreditar o contrario é a consequência de uma grande manipulação que continua criando opressão até hoje. Ho’oponopon
Eu sofri muito por causa de relacionamentos intimos . As vezes tenho a sensação que eu participei de um grande jogo sem nunca entender as regras e me lasquei geral! Não gosto de jogos de tabuleiro, de estratégia, sou sincera, sou real. A sociedade força as pessoas a ficar em relacionamento por causa de convenções, dinheiro ou para não ficar sozinhos. Logo vem os filhos, a família, mas ninguém sabe como lidar com isso direito e todo mundo se machuca. Eu nunca quis repetir esse esquema doido. Sofri na infância de ver os meus pais brigar e se separar. Provavelmente por isso preferi ser livre e ficar solteira. Rainy night é essa tristeza de ver que alguém que eu amava e que me amava estava preso e infeliz num casamento mas a verdade era gritante. Ele também queria ser feliz e livre mas ficava nessa situação por comodismo. É assim, liberdade também tem um preço alto para pagar: o de ficar nas margens.
Essa música é um rezo de manifestação: chamei com toda a minha alma para ter um lugar na terra onde eu poderia ser feliz, amar e criar. Afirmei que eu era filha de deus mesmo e que eu merecia o amor dele. Manifestar é possível quando nos sentimos merecedores do amor divino porque sabemos que fomos criados pela mesma energia que cria tudo que existe, não existe separação e estamos sendo abençoados a cada momento quando paramos para perceber. E essa manifestação funcionou de forma muito magica
Quando a gente recusa seguir os mandamentos da sociedade, somos taxados de perdedores porque não podemos demostrar o sucesso materialmente. O caminho espiritual é o contrario de uma acumulação material: é uma desmaterialização, uma volta ao espirito. Então ninguém entende: parece que somos loucos, que estamos tirando onda ou que somos preguiçosos porque nada do que é considerado marco de sucesso pela sociedade nos interessa de verdade. Nesse reinado material não somos dignos de respeito, mas quem é o rei desse mundo de verdade? Hoje eu sei que estou ganhando porque me sinto cada vez mais próxima de ser quem eu sou de verdade e essa riqueza, ninguém tira de mim. O ganho material sera apenas a consequência.
Jenna Soame,
Diretora de eventos musicais, Londres.
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